em14/10às19h

Enchendo as linhas de rabiscos que anseiam uma interpretação qualquer; ela se coloca entre a tinta e o papel, nas entrelinhas, que só os loucos lêem..Ficaria assim por longas horas, imaginando-se grafada em páginas, por detrás das letras, camuflando mensagens e espionando faces que escorrem os olhos nos garranchos alinhados. Mas o tempo tem asas nos pés e não se cansa de voar, voar, voar.. e ela tem pressa de viver.
Precisa de uma rotina de tarefas para sentir-se completa e prossegue catando palavras pelos corredores, formando versos que vão perdendo-se por acaso; nas prateleiras das bibliotecas, pela janela do ônibus..nos sentimentos que não expressa. Ela era um imenso livro, recheado de signos inverossímeis. Ela precisa ser lida, decifrada. Ela quer teu olho, tua atenção nesse mundo de significados acumulados em si durante tanto tempo, tanto.
Ela precisa de tudo isso porque ela têm de ser Humana.

Maybe not

Eu preciso, verbalize-me, por favor. Me coloque nas tuas letras, é um doce pedido. Sinto falta de nós dois, de A à Z, dos tapetes...Vc está aqui, sempre está; mas meu vazio voltou a crescer, ele me acena de algum ponto dentro de mim...






Nós não temos nada a perder, ou talvez não...
Cegos
estamos todos
um pouco mais a cada dia
nos guiando pelo toque
cheiros, perdidos em agonia
com as mãos espalmadas
rumo ao nada absoluto
Cegos
estamos nós...

A tarde da moça de olhos tristes

Puxou a cordinha e as portas abriram-se numa desengonçada pancada. A poeira subiu juntamente com tantos dejetos quaisquer. Seguiu pelo velho novo caminho à sombra das mesmas mangueiras e cajueiros. Observava os desenhos de sombra e sol na trilha de concreto, à passos lentos, de quem sabe exatamente em qual corredor sua sala espera, degustando o cheiro dos frutos tropicais que fazem lama nessa época...
Parou.. e reparou na deficiência dos que não dependem de rampas de acesso, e como muitas vezes o homem complica mais do que facilita... Continuou, pelo corredor, passado a vista pelos cartazes, propagandas e detalhes fortuitos que, se registrados, dariam uma bela fotografia, talvez...
Girou a chave, entrou, acendeu as luzes, pôs a bolsa sobre a mesa, ligou o ar-condicionado, cada ato executado como se fosse automático, como se já fosse rotina... mas tudo era novo, toda a encenação.. Sentou, abriu os livros; caneta, cabeça, cadernos e coração.
O chaveirinho de tambor bunitinho ainda balançava, e fazia um barulhinho lembrando a onomatopéia que denuncia o tempo passar...mas o tempo não passava e ninguém batia à porta, tomado por desespero, ou a clamar por ajuda. E ela estava alí: disposta a ajudar, ouvir, ser útil, enfim...mas esquecera que vive num mundo de pessoas independentes, num amontoado de solidões egoístas, na esfera da hipocrisia coletiva!
Desistiu, a moça dos olhos tristes, trancou a porta novamente, trancou-se num cubículo frio - e isso, de certa forma, é até agradável - mergulhou no silêncio das cadeiras, na inexistência de uma presença humana... afogou-se em si e desapareceu.

someone changes my day...

Entretanto, eram amigos a algum tempo. Deitados, não, jogados no tapete felpudo no chão da sala. Estudaram juntos algumas vezes, foram colegas de classe. Ela ficava pensando no que acontecera, mas não sentia vergonha de encará-lo; o toque das mãos masculinas, o cheiro do macho, tudo muito selvagem, mas, por dentro era doce, suave e tranquilo...

...Como o silêncio que circulava no ambiente, embalando dois corpos embriagados de êxtase.Saíram. cada um de seu mundo, de sua confusão, sem esperar ao certo um encontro casual, em lugar algum. Era noite como uma noite banal, cercada pelo concreto, crepitando em pontos de luz suspensos no espaço que iluminavam ruas e aqueciam fantasmas ou espíritos sem luz. Tinha uma mania ele de mecher no cabelo enquanto lia, e assim ía; e ía lendo, assim, bem folgado até se dar conta, novamente, do mundo, da pessoa ao seu lado; que ele conhecia.

Sorriram...da maneira como ela riu ao sair de casa, sem rumo. Tinha na bolsa grande tudo jogado: batom, chaves, preservativo, carteira... e lá no fundo um cd de blues. Trancou a porta de casa, ligou o carro e entrou na livraria. "Meu primeiro salário! mereço um livro...", pensou baixinho.

E agora, eram corpos encaixados, mãos espalmadas, sincronia de movimentos, cabelo e respiração que ia e vinha, ia e vinha, vinha...ás vezes quase faltava! Eram taças de vinho, o ambiente em blues, cheiro dele nela, doce dela nele! Beijo de quatro olhos fechados, perdidos na imensidão de seus cosmos, unidos pelo elo que o braço formava em volta um do outro...

Igual ao abraço na livraria. o abraço de encontrar alguém conhecido. após tanto tempo, após escaparem todos os dias da comum cidade caótica, da mesma rotina monótona, de um dia qualquer! Sentaram, beberam, gargalharam, discutiram - sim! o amor deixa suas marcas - silenciaram, e, de mãos tímidamente tocadas, escreveram mil perdões nas entrelinhas, num diálogo que alí não cabia. O som, o sax, o ritmo, tudo embalava duas vidas no memso tom. intensidade. eles dançavam, brincavam com uma cumplicidade espantosa, escondiam-se, risinhos voluptosos.. ela sutilmente dançava sorrindo sozinha e o fazia de voyer. gostava da sensação de ter o olho dele escorrendo pelo corpo; dava até arrepio, sem nem ser tocada! Ele gostava do sorriso, do rubor na face, do corpo brilhando em suor, dos seus cinco sentidos aguçados pela presença daquela mulher, que tava na turma dos colegas de classe, paqueras de Faculdade, no tempo dos vinte e poucos anos...

Perderem-se, outra vez e mais uma, naqueles cubos solitários, abaixo das luzes dos homens, presos no cotidiano desesperador. e isso não mais desenhavam as vontades. os desejos eram únicos e recíprocos. E aquela música marcou, e o encontro rolou... e, como estavam, vão continuar, mas dessa vez, num infinitivo de dois particulares.

Obrigada...

Meu chá está esfriando, eu me pergunto porque
Por que eu saí da cama
A chuva da manhã está sob a minha janela
E eu não consigo ver nada
E ainda que pudesse, tudo estaria cinza
Mas seu retrato na parede me faz lembrar que não é tão ruim
Não é tão ruim

Bebi tanto a noite passada, tenho contas a pagar
Minha cabeça está doendo
Perdi o ônibus e hoje será um inferno
Estou atrasada pro trabalho de novo
E ainda que estivesse lá, todos insinuariam
Que eu não ficaria até o fim do dia
E então você me liga, e não é tão ruim
Não é tão ruim

Eu quero agradecê-lo
Por me dar o melhor dia da minha vida
Oh, simplesmente estar com você
É ter o melhor dia da minha vida

Empurro a porta, cheguei em casa finalmente
E estou completamente molhada
Então você me alcança uma toalha
E tudo o que vejo é você
E, mesmo que minha casa desabasse agora,
Eu não perceberia
Porque você está perto de mim.

Eu quero agradecê-lo
Por me dar o melhor dia da minha vida
Oh, simplesmente estar com você
É ter o melhor dia da minha vida


eu espero que sim...

tudo muito abafado e seco no nosso dia de ressaca moral, entretanto, espero eu que seja realidade as verdades que todos comentam e que preenchem meu vazio de cores alegres e serenas. Quando te olho nos olhos enquanto me derreto toda, consigo ver tua pupila dilatando, quase posso tocar tua alma..e te passo um pouco de mim através dessa janela aberta. E se não for, já aprendi a guardar as cores da esperança e só deixar doer o suficiente enquanto a lágrima escorre aqui dentro..e purifica!..pra renascer depois, mais forte, mais viva...renascer pras possibilidades, porque é só o talvez que temos a dar uns aos outros...
de vc, eu espero que sim.

o bandido voltou!

o bandido voltou!
e não deu pra fugir..chegou me tomando de assalto, com seu elo de carne e pêlo em volta de meu corpo, com seu cheiro me entorpecendo.
o bandido voltou!
nem marquez me salva, nem todas as veludosas vozes que vagam nas melodias que encantam, nem tudo nem nada, nada impede, nada detém...talvez nem eu queira, tanto quanto quero.
de repente, o bandido, sob meu lençóis, debaixo do meu vestido, me cobrindo com sua essência, espalhando seu rastro pela minha sala, de novo acalmando meu caos, camuflando a realidade com sua presença de primavera...fingindo que a primavera não vai acabar, mas ainda lembro que quando esquenta muito é porque depois vai esfriar.
o bandido se alimenta em mim, como um vampiro suga todo o sangue quente..e eu permito: seus dentes em mim, sua língua percorrendo meu corpo, o peso de sua mão nos meus pedaços, a lascívia escorrendo de nossas carnes..
eu permito porque o bandido me traz o algo em troca; mesmo que efêmero, mesmo que confuso... ele deixa em mim muito mais, além da misteriosa impressão de que vai voltar...

e eu repito:
bandido, volte sempre...

cabe(em(não(cor(meu)ação)cabe)minha)ça

[meu] pensamento

são tudo recordações
não é o bastante
não cabe em si
precisa sair
voar
seguir em frente
quer correr e divagar
devagar
devagar
tenta esquecer
tá em você
foge!
tá na lua mergulhado em si
cheio de dor
multicolorido
na tranquilidade da ébria paz
faz prece
imagina
acredita!


e eu nem sei por onde anda...

deite comigo

enquanto estiver frio
e quando tiver calor
esta noite
à beira do abismo
bem perto
de todo jeito
em noites curtas e longas
estou aprendendo a esperar
deite comigo eu repito
sinto seu gosto dentro de mim...


uma brisa que chega, me faz recordar
das noites sonhos e melodias
e o bailar de nossos corpos
o fôlego, teus dentes
as marcas que vc deixou em mim...

Big Calm

Ouço-te, apenas, e, simultaneamente, pensando no que te dizer quando você terminar de cuspir tua dor, teu vazio..mas palavras não preenchem vazios, não são corpóreas. Ficamos em silêncio, absortos cada qual em sua reflexão... Nós poderíamos ficar simplesmente sentadas aqui versando sobre as horas de solidão, recordando os dias em que tudo se mostra raro e impossível; mas perderíamos as cores do dia, a brisa quente que nos faz sentir vivos.
Viva, amiga, viva tudo o que há pra viver, tudo o que vc trouxe p sua vida e mais aquilo que veio de brinde, porque não é vão, não é irreversível e tudo pode ser aprendido; absorva e filtre...
Proteja-se e lute!
Cansei de ti dentro de mim..transbordou, enfim, e era exatamente isso o que eu queria: me encher de você!..tua barba por fazer, teu cheiro de macho, a força da tua mordida que não me deixa marcas perceptíveis..pronto, já chega. Porque se eu abrir a porta propositalmente pra vc me invadir, todo dia, todo dia, periga eu não morar mais em mim, esquecer das contas pra pagar, fingir que a vida é só respirar vc.
Aliás, cansei dessa palavra: você.
cansei e queria te dizer..mas quando chego na tua frente e coloco a mão na cintura, vc muda de nome, teu nome, e repete repete repete...
Existem gotas de sangue em cada ponto da reticência...

Pra bem falar a verdade, esqueço que tudo não passa de uma grande farsa.
Finjimos eu, você e mais o mundo inteiro, enquanto tudo explode lá fora, enquanto muito implode aqui dentro. Somos complexos transbordando enígmas quase indecifráveis, mas nem por isso menos misteriosos, receosos de si..pq ninguém sabe o quanto de sangue mancha a alma ou o quanto de trevas ilumina as incertezas.
Torna-se fácil acreditar nas próprias mentiras quando os tempos estão estranhos, as piores à se render; indefeso de si mesmo..

Lua cheia

o que tu anda fazendo?!
pensando...muito,e tentando colocar as coisas no lugar..
tá dando certo?
tô lutando pra isso,já reparou que é lua cheia?
[ele olha pro céu e fica assim durante alguns instantes...pensativo...sabia que ela tava querendo escapar à francesa, e achava isso nela engraçado]
é..é sim!tá vendo São Jorge?sabe a oração?
não, mas já devo ter visto em algum lugar.gosto mais da música...vc sabe tocar?
[ela ficava alí, olhando-o tocar, desafinar baixinho e com o olho brilhando à lua...]

É chato fingir que está por perto..


Ela liga, manda mensagens, deixa frases soltas escondidas por entre as páginas do livro que estou devorando e invade os lugares aonde não estou..contagia todos os móveis de minha sala sem sua presença, ensopa meus lençóis com seu perfume e exala sua libido pelo ar num rastro que não consigo acompanhar! Isso me angustia tanto... principalmente nesses dias em que acordo oco, em busca de absorvê-la, pq eu quero ela dentro de mim, me transbordando, vc entende?!
Sim; entendo desse embrulho que dá no estômago quando o coração bate em descompasso. Sei bem como é chato fingir que está por perto; ouvir, ler, sentir e não poder tocar...tocar. E nessa hora nenhuma palavra conforta, pelo contrário, instiga!..é uma pena eu não saber dedilhar as cordas do teu violão pra te cantar alguma canção que traga paz; nem eu msma estou em paz...

Casa comigo!!!



Michel Melamed em Regurgitofagia.

O solitário desabafo

Letreiro em papel, berra às vistas: "Você quer mudar alguma coisa?", pra quê? pra despertar o confronto mental de sempre, que pelo menos vai distraindo dentro do ônibus, pra ela não lembrar que está percebendo aquele cara insuportável encarando-a com a fixação do olhar de um predador nojento e selvagem, e também não se importar com o despeito que provoca nas outras fêmeas, fazer de conta que não tem um quebranto qualquer em sua direção...

Exausta e faminta, de todas as fomes e cansaços possíveis, mudaria tudo, não, melhor: mudaria nada. Isso é esforço inútil. Eu, do alto de minha pseudo-maturidade, cabelos tingidos e ex-fumante, não, melhor pôr as pernas pra cima e pensar a iniciar a revolução da minha cama. Muito me incomodaria ouvir as minhas lamúrias, um incorformismo desgraçado, principalmente de ser Humana e não me contentar com nada, nem com pouco, nem talvez muito...

Explode!

explode aqui dentro a vontade de pôr meu olho na linha reta e imaginária do teu olhar. curiosidade de te enxergar por dentro, pela janela da tua alma; mas dá medo de não a encontrar por dentro de ti, sei lá, de repente tá perdida, de vacilo por aí...aí é vc dentro do meu pensamento, nadando no meu lúdico. eu sei pq alguma coisa aqui dentro implode e me encho de escombros e muita ´poeira. Acendo um cigarro e disfarço, ponho aquela máscara que te falei semana passada, aquela que vc nem viu e nem lembra que falei..de certa forma, ainda bem, pq assim não corro o perigo de vc me desmascarar, qualquer um pode me colocar nessa situação humilhante, menos vc. Pq, se fosse vc quem destruisse minha farsa, o teatro todo explodiria e voaria pedaços de nós pra todos os lados..e assim não é legal: muita sujeira pra limpar, cacos voando em velocidade alucinante que nem machucariam ninguém.
E, se for pra eu explodir, meu bem, queria poder sobrar apenas numa sanguínea pintura surrealista nessa parede.